Um mês havia se passado. Cristofer ficara, no total, uma semana no
castelo. Tempo suficiente para recuperar suas forças. Agradecera ao rei e à
rainha pela hospitalidade e pedira desculpas pelo transtorno que causara.
Despedira-se da princesa e voltara à sua vida normal. Seus pais não ficaram
sabendo do acontecido. Cristofer jamais iria preocupá-los. Apenas dissera que
ficou duas semanas longe porque estava em missão especial.
- Então hoje a princesa irá casar-se, não é?
- Ah, sim, pai. O casamento será na praça.
- Você irá?
- Claro, mãe, não perderei isto por nada.
- E Ana Clara? Irá encontrá-la por lá?
- Sim, foi o que combinamos, mãe.
- Não temos mais visto sua namorada, Cris. Quando ela nos visitará
novamente?
- Em breve, pai – respondeu o rapaz, distraidamente.
- Que garota adorável! Você tem muita sorte, Cris.
- Obrigado, mãe. A propósito, vocês irão ao casamento?
- Mas é claro! Não perderemos o acontecimento do ano, não é, querido?
- Tem toda razão. Estaremos lá, Cris – disse o homem, animado.
Cristofer e seus pais estavam na praça. Cordas foram esticadas da
extremidade até o centro da praça, formando um estreito corredor por onde os
noivos andariam até chegar ao altar.
- Conseguirá encontrar Ana no meio desta multidão, Cris?
- Claro, mãe, não se preocupe. Vejam, os noivos estão vindo.
À medida que os noivos se aproximavam, as
expressões nos rostos dos pais de Cristofer foram mudando de alegria para
preocupação. Quando os noivos passaram por eles, Cristofer olhou para ambos.
Karus era só sorrisos, mas Ana Clara estava com o olhar abatido, infeliz. E
ficou mais infeliz quando viu Cristofer olhando diretamente em seus olhos. A
garota percebeu que, ao lado de Cristofer, seus pais estavam com expressões de
espanto.
Os pais de Cristofer entreolharam-se,
boquiabertos. Era inacreditável que Ana Clara fosse a princesa e agora estava
se casando com um príncipe de um reino distante. Embora estivessem presentes no
noivado, estavam muito distantes para reconhecer a menina. Mas agora, no
casamento, ela passara bem próximo a eles. Quando o pai de Cristofer foi
perguntar o que estava acontecendo, reparou que o filho não se encontrava mais
ao seu lado.
A cerimônia começou. Um religioso, contratado pelo rei Xavier, palestrava
sobre a vida de um casal. O palco onde se encontravam os noivos era enorme. Ali
também estava o rei Xavier, a rainha Tamara, o rei Sebastian e, no canto
esquerdo, os sete guerreiros negros.
O discurso prosseguiu, cada vez mais enfadonho. Finalmente o homem
decidiu fazer o encerramento:
- Se alguém tem alguma coisa contra esta união, fale agora ou cale-se
para sempre.
- Eu tenho! – gritou um jovem, vestido de monge, que andava pelo estreito
corredor.
Todos olharam na direção do rapaz, que se aproximava tranquilamente. Ao
chegar ao palco, o rapaz subiu os degraus e gritou novamente:
- Eu tenho. Sou totalmente contra esta farsa!
- Cris, o que está fazendo? – perguntou a garota, preocupada com a
segurança dele. Se antes foi brutalmente castigado, agora seria morto, com
certeza.
Cristofer a ignorou. Apenas apontou o dedo na direção do rei Sebastian e
seu filho.
- Vocês! Vocês dois não passam de pessoas desprezíveis, que pensam
unicamente em si.
Os dois olharam furiosamente na direção de Cristofer, mas fizeram
silêncio.
- A princesa Ana Clara está sacrificando sua felicidade a pedido do pai,
que teme o rei Sebastian por causa dos seus guerreiros de preto – gritou
Cristofer a pleno pulmões. – Ela não gosta do príncipe Karus, sou eu quem ela
ama.
As pessoas se olhavam, confusas. Aquele rapaz devia ser louco, alguns
comentavam. Outros acreditaram nas palavras de Cristofer, e alguns imaginavam
que talvez fosse um espetáculo proporcionado pelo rei para alegrar o casamento.
A confusão era grande, mas apenas olhavam para o monge e murmuravam entre si.
- Vocês são dois cretinos, que se acham no direito de manipular a vida
dos outros – gritou Cristofer, apontando mais uma vez ao rei Sebastian e seu
filho.
O rei Xavier ficou em
choque. Aquele rapaz poderia trazer a guerra ao seu reino.
Uma guerra que não poderia vencer. Mas antes que dissesse ou fizesse qualquer
coisa, ouviu o rei Sebastian se pronunciar:
- Basta! Guerreiros negros, matem esse infeliz.
Os sete homens cercaram Cristofer. Cada um daqueles homens possuía uma
arma diferente. O monge, porém, estava desarmado. O primeiro a atacá-lo foi o
que usava uma espada. Com técnicas de esquiva fantásticas, o monge evitou a
sequência de golpes do adversário. Em instantes desarmou-o, segurando o braço
que empunhava a espada e acertando um forte chute em seu queixo. Agora o monge
estava armado. O segundo a atacá-lo usava dois nunchakus. Com a espada,
Cristofer evitava os golpes facilmente. Acertou, com o lado da espada, os
punhos do homem, que deixou cair suas armas. Saltando e girando o corpo com
perfeição, nocauteou o adversário com um chute em seu rosto. Dois estavam fora
de combate.
Dois guerreiros negros resolveram atacar em conjunto. Um usava
uma lança e outro uma corda. Cristofer defendia-se combinando os nunchakus com
técnicas de esquiva. Conduziu a luta de uma forma que a corda de um ficou presa
na lança do outro. Então o monge chutou a lança com força, fazendo os
guerreiros soltarem suas armas. Ao mesmo tempo em que acertava o rosto de um
com um dos nunchakus, acertava as pernas do outro com outra arma. Chutou o
rosto de um e, com a mesma perna, acertou uma joelhada no rosto do que estava
abaixado por causa da dor na perna. O homem caiu no chão, com o joelho do monge
em seu rosto.
Vendo a incrível habilidade do monge, os três últimos homens atacaram
simultaneamente. Mas o jovem era rápido e habilidoso demais. Enquanto atacava
um, esquivava-se de outro e bloqueava os golpes do terceiro oponente. Não
precisou muito tempo para que os sete guerreiros negros estivessem no chão,
inconscientes.
O rei Sebastian não queria acreditar. Como era possível, aquele garoto
conseguiu derrotar seus sete melhores homens? Era um completo absurdo, pensava
o homem. Mas tinha acontecido. E agora? O que faria? Tinha que jogar a última
cartada. Era sua única chance.
- Como se atreve? Você ousa zombar de mim, moleque? Fique sabendo, rei
Xavier, que este rapaz condenou o seu reino. Virei com o meu exército, pode ter
certeza.
O rei Xavier nada disse. Parecia pensativo, tentando assimilar melhor os
últimos acontecimentos.
- Até parece! – gritou o homem que subia os degraus do palco.
O rei Sebastian olhou, surpreso, para o mestre Ozamu.
- Você quer vir com seu exército? Então venha. Vamos ver o que pode fazer
contra um batalhão de centenas de homens iguais a este – falou o mestre,
apontando para Cristofer. – E lhe digo
mais: depois dos acontecimentos de hoje, o rei Xavier vai, com certeza, querer
financiar uma ampliação em nosso templo. Teremos mais área para treinar e mais
homens. Quando você chegar, rei Sebastian, não seremos centenas, mas milhares.
O rei Sebastian mirou um olhar assassino em mestre Ozamu. Mas
não tinha palavras para uma resposta. Apenas olhou em volta e reparou que
todos, à exceção dele e seu filho, mantinham-se calmos. O rei Xavier parecia
até contente. Trocou sorrisos com sua filha, o que deixou o rei Sebastian e o
príncipe com mais raiva ainda. A rainha parecia partilhar do sentimento do
marido, olhando carinhosamente para a princesa. Era o fim da linha para
Sebastian e seu filho.
- Vamos – falou o homem para o seu filho.
A princesa aproximou-se de Cristofer e o beijou apaixonadamente. A
multidão aplaudia avidamente. Os malignos rei Sebastian e seu filho Karus
haviam sido desmascarados, conhecendo a derrota.
Após o beijo, Ana Clara segurou a mão de Cristofer e aproximou-se de seus
pais.
- Eu achei que vocês não se importavam comigo.
- Filha, nós te amamos muito – falou a rainha, tocando no rosto da
garota. - Você não imagina o pesadelo que seu pai e eu enfrentamos com toda
essa história.
- Mas nunca demonstraram, mãe. Sempre se mostraram frios e calculistas,
como se apenas o reino importasse e eu não.
- Agimos assim, querida, porque não queríamos que o seu sofrimento
aumentasse. Sua carga já era grande, não poderia ficar maior – disse o rei.
E Ana Clara entendeu. Sua dor seria ainda maior se soubesse do sofrimento
de seus pais. Largou a mão de Cristofer e os abraçou com força.
- Mestre, você sabia que eu faria o que fiz hoje? – perguntou Cristofer,
aproximando-se de Ozamu.
- Calculei a possibilidade de que tentasse algo, mas não tinha a menor ideia
do que pudesse ser.
- Obrigado por me apoiar, senhor.
- Tudo bem. Era o mínimo que eu podia fazer por duvidar de sua
integridade.
- Cris – gritou Ana Clara, acenando para ele. - Venha aqui.
Cristofer sorriu para o mestre, que retribuiu. Aproximou-se de Ana Clara.
- Esta foi a coisa mais estranha que já vi em toda a minha vida, mas acho
que obrigado é a palavra que mais se enquadra no momento – disse o rei para
Cristofer.
- Não há de quê, senhor.
Aproveitando a oportunidade, o rei aproximou-se da beirada do palco.
- Povo de Flor-de-lis, vimos hoje o bem triunfar. Os malignos rei
Sebastian e príncipe Karus conheceram o amargo sabor da derrota – disse o rei,
apontando para os guerreiros ainda inconscientes, no palco. – Que isso sirva de
lição a todos nós. Que sejamos capazes de agir sempre com bondade e justiça,
pois os frutos colhidos amanhã serão o resultado do que plantamos hoje.
A multidão aplaudiu mais uma vez. Gritavam o nome do rei, da rainha e da
princesa. Também gritavam: “Viva o guerreiro”, pois não sabiam o nome do rapaz
que lutara no palco.
Para a alegria de Cristofer, seus pais subiram ao palco e o abraçaram.
Nunca o tinham visto lutar, parabenizaram-no por sua habilidade.
O rei, a rainha, a princesa, Cristofer e seus pais deixaram o palco e
andaram pelo corredor, recebendo os aplausos da multidão. Atravessaram a praça
até chegar à carruagem que os aguardava.
- Minha filha tem sorte de conhecer você, Cristofer. Esperaremos sua
visita no castelo, no próximo domingo. Venha almoçar conosco – disse o rei,
colocando a mão no ombro do rapaz.
- Obrigado, senhor.
- Nós que agradecemos, Cristofer – falou a rainha, sorrindo. O monge
retribuiu o sorriso.
- Finalmente vamos ficar juntos – disse a princesa, beijando-o. Em
seguida, entrou na carruagem.
Os reis e a princesa abanaram para Cristofer e seus pais, e a carruagem
partiu em direção ao castelo.
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