domingo, 12 de fevereiro de 2017

Capítulo 17

Cristofer acordou-se pela tarde, ao pôr-do-sol. Estava em sua casa. Passara boa parte do dia dormindo, devido à exaustão provocada por sua insana aventura. Realmente, invadir o castelo do rei para localizar o quarto da princesa foi uma coisa muito doida que fizera, mas que outra forma de falar com a menina? Ao menos agora sabia a verdade. Ana Clara ainda o amava.
O rapaz foi até a cozinha, jantou com os seus pais em ritmo de alegria e voltou ao quarto. No dia seguinte iria ao templo treinar, como de costume. Ainda bem que conseguira realizar a sua missão na primeira tentativa. Se não conseguisse, teria que tentar novamente no próximo sábado e poderia ser tarde demais – Ana estava com o casamento marcado na praça, no próximo domingo.
O que faria? Sua namorada iria casar-se com o príncipe Karus em sete dias. O que poderia fazer além de assistir ao casamento e desejar felicidades aos noivos?
Mas Ana não iria ser feliz ao lado do príncipe e deixara isso bem claro. Ela não o amava. Quando conversou com a menina, reparou não só nos adjetivos que atribuíra ao príncipe, mas também em seu tom de voz – ela realmente desprezava o tal Karus.
Mas não havia nada que pudesse fazer a respeito, pensou o monge tristemente. O rei Sebastian, de alguma forma, intimidara o rei Xavier, a ponto de fazê-lo obedecer. Qualquer coisa que o rei Sebastian pedisse, o rei Xavier não mediria esforços em realizar. Mesmo que isso significasse sacrificar a felicidade da própria filha.



- O almoço estava magnífico, Xavier. Você sabe mesmo agradar as visitas.
- Obrigado, Sebastian, é bondade sua.
            A princesa observava, em silêncio, seu pai trocar amenidades com o rei Sebastian. Reparou que Karus estava emburrado com o seu distanciamento. Realmente, Ana Clara o ignorara a manhã inteira. À mesa, sentara ao seu lado, mas não trocava palavras com ele. O pensamento da garota a situava no momento em que esteve com Cristofer.
            O rei Sebastian comentara exaustivamente, para desgosto do rei Xavier, o episódio do visitante noturno. À hora do almoço, porém, passara a falar de negócios.
            Naquele momento, os reis e a rainha pareciam bem animados, falando de uma série de empreendimentos que tinham em mente. A princesa continuava sonhando acordada, pensando na visita que tivera na calada da noite. O príncipe permanecia emburrado.
- Majestade, lamento interromper sua refeição, mas há homens que lhe trazem um importante recado – falou o mensageiro, aproximando-se da mesa.
- Disseram o assunto, Raimundo? – perguntou o rei Xavier mecanicamente.
- Sim, senhor. Eles falaram que se trata da invasão em sua residência na madrugada de ontem.
            Todos olharam rapidamente para o mensageiro Raimundo.
- O que devo dizer a eles, senhor?
- Diga-lhes que irei atendê-los o mais rápido possível, Raimundo.
- Sim, senhor – disse o homem, fazendo uma reverência e retirando-se da sala.
- Parece que vamos descobrir quem era o invasor - comentou o rei Xavier, satisfeito.
- Seus homens agiram rápido. Gosto disso – falou o rei Sebastian.
- O que pretende fazer a respeito, querido? – perguntou a rainha.
- Punir o miserável, é claro. Você acha que vou permitir alguém invadir o meu castelo, colocando em risco a minha família, e sair numa boa? Esse desgraçado vai sofrer.
            Ana Clara empalideceu. Se conseguiram descobrir que o invasor era Cristofer, então o ex-namorado estaria em grandes apuros. Mas talvez não tivessem pego o seu amado. Talvez fosse outra pessoa...
- Bem, vamos? – perguntou o rei Xavier, exibindo um largo sorriso.
            Todos se encaminharam à sala do trono, onde o rei atendia as pessoas para resolver os problemas do reino. Ao chegar à sala, o rei Xavier sentou-se em sua poltrona e a rainha ao seu lado. O rei Sebastian, o príncipe Karus e a princesa Ana Clara ocuparam outros assentos.
            Na sala estavam dois homens de olhar sério e um terceiro com a cabeça coberta por um saco, com o corpo todo machucado – havia levado dezenas de chicotadas.
            - Majestade, eu sou o mestre Ozamu. Este é um dos meus discípulos e este outro – apontou para o rapaz machucado - é o que invadiu a sua residência.
            - Quero ver o rosto dele – disse o rei.
            - Certamente, majestade. Apenas gostaria que o senhor soubesse que ele já foi terrivelmente castigado.
            - Como você descobriu que era ele? – indagou o rei.
            - Porque pedi para este meu discípulo segui-lo, majestade. Ele o descobriu abandonar uma estalagem, saindo pela janela do banheiro. Em seguida, foi em direção ao castelo e escalou o muro.
            O homem fez uma pausa, saboreando o momento.
            - Infelizmente, majestade, devo dizer-lhe que este imbecil também é meu discípulo. Hoje pela manhã o interrogamos e ele se viu obrigado a confessar tudo. Então o punimos severamente, como o senhor pode constatar.
            - Sim, você fez muito bem, mestre Ozamu – falou o rei, olhando para o rapaz que exibia costas, barriga, peito e braços marcados a chicote. – Acho a punição adequada. Que isso sirva de exemplo. Agora, por favor – disse o rei, apontando para o saco na cabeça do rapaz.
            - É claro, majestade – disse o mestre, retirando o saco.
            - CRIS! – gritou a princesa, angustiada com o rosto sofrido do rapaz.
            A garota levantou-se, foi na direção do ex-namorado e o abraçou.
            - O que fizeram com você, querido? – falou a menina, em prantos.
            Cristofer gemeu. Gostaria muito de abraçar Ana, mas não naquele momento. A garota sentiu seu sofrimento e deu um passo para trás.
            - VOCÊ! – apontou para o mestre, com um olhar de puro ódio. – O QUE VOCÊ FEZ, MISERÁVEL?
            - Ana, não faça isso – pediu Cristofer, entre um gemido e outro. – Ele vai me expulsar do templo.
            A garota olhou rapidamente para Cristofer e dirigiu seu olhar mais uma vez ao mestre.
            - EXPULSAR? EXPULSAR? EU É QUE DEVERIA EXPULSÁ-LO DESTE REINO! – disse a garota, colocando toda a raiva para fora.
            - Chega, filha – falou o rei, em tom firme.
            Mas Ana Clara não conseguia se conter. Estava magoada, frustrada, ferida e agora isto: seu verdadeiro amor ali, todo machucado, apenas porque a procurou para conversar.
            - NÃO, PAI, NÃO CHEGA. NUNCA VAI CHEGAR! – gritou a menina, as lágrimas escorrendo pela face.

            - Ana, por favor, pare – falou Cristofer, desmaiando em seguida.

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