A princesa chegou ao castelo rapidamente. Estava radiante com o seu
relacionamento com Cristofer. Jamais imaginou que a família do rapaz fosse tão
pobre, mas isso não importava nem um pouco. Ela o amava e isso bastava. Seus
pais teriam uma agradável surpresa quando apresentasse a eles o namorado,
pensava a menina. Certamente iriam gostar de Cristofer, pois era um rapaz
encantador. Com este último pensamento feliz, entrou em seu castelo.
Ana Clara percebeu que seu pai conversava alegremente com um homem que se
tratava de outro rei. Ao avistá-la, chamou-a com entusiasmo.
A garota aproximou-se, observando que o tal rei estava acompanhado de um
rapaz que, aparentemente, era um príncipe; também estavam próximos àquele rei
sete homens, totalmente vestidos de preto e fortemente armados. O que estaria
acontecendo?
- Filha, este é o rei Sebastian – disse o rei Xavier, estendendo
graciosamente o braço na direção do homem.
Ana Clara aproximou-se, inclinou um pouco o corpo e cumprimentou-o.
- Olá, rei Sebastian, é uma honra conhecê-lo.
O homem sorriu, abaixou-se e beijou a princesa na testa.
- A honra de conhecê-la é toda minha, princesa - disse o homem, após beijá-la.
- E este é o príncipe Karus – falou o rei Xavier.
- Príncipe... – disse Ana Clara, estendendo a mão direita em direção ao
rapaz.
Karus pegou a mão de Ana Clara e a beijou.
- Faço minhas as palavras de meu pai, princesa – disse o rapaz, com um
largo sorriso.
- Filha, você já é uma mocinha - comentou o rei Xavier.
- Realmente. E eu diria que é uma moça muito bonita – concordou o rei
Sebastian.
- Tem razão, pai – disse o príncipe Karus.
Ana Clara olhou, curiosa, na direção do rei Sebastian e seu filho. Alguma
coisa parecia errada com eles. Ambos exibiam um olhar de espertalhão e um sorriso
enigmático.
Sem saber direito o porquê, Ana Clara começou a se sentir incomodada com
a presença deles. Algo estava errado. O que seria?
- Bem, filha, chega um momento em nossas vidas em que devemos começar a
pensar no futuro.
- É verdade, princesa. Além do mais, nesses tempos turbulentos, nada como
os reinos unirem suas forças – falou o rei Sebastian.
- Eu não estou entendendo... – respondeu Ana Clara, cuja sensação de
mal-estar, por algum motivo, aumentava.
Ana Clara olhou para sua mãe, que ainda nada falara. A mulher apenas a
observava, como se a estivesse estudando.
- Filha, eu já ia chegar ao ponto comentando pelo rei Sebastian. Os
tempos são difíceis, luta-se muito pela paz que o mundo não consegue alcançar.
O rei Xavier fez uma pausa dramática, como que para dar ênfase às suas
palavras. Em seguida, prosseguiu:
- Você é uma princesa e tem uma enorme responsabilidade nas mãos. Ana,
seu dever é ajudar o reino a conquistar a paz tão desejada.
- Pai, sinceramente, não estou entendendo nada. O que está acontecendo,
afinal de contas?
Por um momento, reinou o silêncio. Ana Clara olhou para sua mãe, que
ainda nada falava; olhou para seu pai, que parecia pensar no que responder; por
fim, mirou os olhos na direção do rei Sebastian e seu filho, que ainda mantinham
aqueles olhares e sorrisos desagradáveis.
- Creio que uma abordagem direta será mais eficaz, rei Xavier – falou o
rei Sebastian. – Permita-me.
Todos olharam para o rei Sebastian. Ana Clara teve a impressão de que
ouviria algo realmente desagradável.
- Muitas guerras estão sendo travadas – falou o homem. – Embora o rei
Xavier tenha anexado várias cidades aos seus domínios, o reino Flor-de-lis está
longe de ser um império. Desta forma, se unirmos a cidade de seu pai com a
minha, alcançaremos rapidamente o nosso grande objetivo e ninguém mais ousará
nos fazer frente.
O rei Sebastian faz uma pausa. Ana Clara tentou imaginar como aquela
história acabaria e o que ela teria a ver com tudo isso. Mas estava confusa
demais para ordenar os pensamentos. Restava apenas escutar o que aquele rei
tinha ainda a lhe dizer.
- Bem, toda princesa um dia irá casar-se com alguém. E quem melhor do que
um príncipe para ser o seu marido?
A princesa desviou os olhos do rei Sebastian, mirando o olhar no príncipe
Karus. Embora não quisesse acreditar que tivesse ouvido as últimas palavras
daquele rei, Ana Clara percebeu que as coisas agora começaram a fazer sentido;
o homem queria unir os dois reinos através do casamento dela com o príncipe.
- O senhor não quis dizer isso – falou Ana Clara, olhando na direção do
rei Sebastian.
O rei Sebastian
nada respondeu. Apenas olhou fixamente na direção do rei Xavier.
- Filha, já está tudo arranjando – explicou o rei Xavier. – Você terá a
oportunidade de casar-se com este rapaz de agradável aparência e, com isso,
tornará os nossos reinos uma grande nação.
Ana Clara olhou para o príncipe Karus. Seu pai tinha razão, o rapaz era
bonito. Porém, aparência não era tudo e seu grande amor se chamava Cristofer.
- Pai, eu já tenho um namorado. O nome dele é Cristofer e combinamos de
apresentá-lo ao senhor e à mãe no próximo domingo.
- Você está namorando? – perguntou a rainha. – Mas por que nunca nos
disse nada a respeito?
- Faz pouco tempo que conheci o Cristofer, mãe. Só dois meses.
- Xavier, esta é uma situação familiar que eu espero ser resolvida logo –
falou o rei Sebastian.
- Sim, Sebastian, asseguro-lhe que tudo está sob controle. As peças se
encaixarão em seu devido tempo.
Ana Clara olhou para seu pai, não querendo acreditar no que acabara de
ouvir. Sua mãe tampouco lhe apoiou contra tamanho absurdo. Não imaginava que
seus pais, seus próprios pais, não se importariam em destruir a felicidade que
conquistara há tão pouco tempo. A garota desviou os olhos de todos, imaginando
o porquê de ninguém se preocupar com os seus sentimentos. O que fizera para
merecer isso? Sempre fora uma boa filha, qual o motivo para ser tratada desta
maneira?
- Princesa, você não vem? – perguntou Raimundo, um dos mensageiros do
rei.
Ana Clara olhou
para o homem, o pensamento voltando à realidade, o rosto abatido.
- O quê? Ir aonde?
- Jantar, princesa. Todos já estão
na sala de refeições, esperando você.
Ana Clara olhou ao redor, confusa.
Perdera-se em pensamentos e nem reparou que seus pais e os convidados não se
encontravam mais por perto.
- Não, Raimundo, estou sem fome. Avise os meus pais que vou direto para o
quarto, pois estou muito cansada e quero dormir logo.
- Sim, princesa – respondeu o homem, fazendo uma pequena reverência e
indo em direção à sala de refeições.
Ana Clara encaminhou-se para o seu quarto, sentindo a depressão tomar
conta de si. O dia havia sido maravilhoso. Conhecera os pais de Cristofer e
passara momentos agradáveis em sua companhia. Na semana seguinte, faria uma
surpresa aos próprios pais, apresentando-lhes o namorado. Mas tal felicidade
durara somente até colocar os pés no castelo. Ali, em sua própria casa,
conhecera o arrogante rei Sebastian e seu estúpido filho, que traziam a
proposta que a afastaria de Cristofer para sempre.
A garota entrou em seu quarto, atirando-se na cama sem trocar a roupa.
Deitada de costas, os olhos apontando para o teto, mirando o infinito, tentou
ver algum sentido em tudo aquilo. Seu pai havia feito muitas guerras, o reino
agora era imensamente forte. Mas o poderoso rei Xavier parecia temer o rei
Sebastian. Que tipo de rei era aquele homem? Como seria o reino que governava?
O que teria feito aquele homem para que seu pai tivesse medo dele? Ana Clara
não fazia ideia. Era como se estivesse tentando montar um quebra-cabeças com a maioria
das peças faltando. O que faria agora?
Ana Clara demorou a dormir. Quando finalmente conseguiu, teve um terrível
pesadelo: sonhou que estava na garupa do cavalo conduzido pelo príncipe Karus.
Enquanto segurava a cintura do príncipe com a mão direita, virava-se para trás
e abanava com a mão esquerda para Cristofer, em sinal de despedida. Suas
lágrimas escorriam abundantemente pelo rosto, ao saber que jamais voltaria a
ver o seu verdadeiro amor.
Ana Clara acordou-se em
prantos. Foi direto ao sanitário banhar-se e trocar a roupa.
Embora ainda faltasse um bom tempo para amanhecer, não queria voltar a dormir.
Após o banho, sentou-se em sua cama e ficou olhando pela janela, esperando o
sol nascer.
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